São Sebastião contra a peste, a fome e a guerra

“São Sebastião desempenhava um papel fundamental entre os presos cristãos, levava palavras de conforto e ajuda aos encarcerados, o que trazia grande consolação a todos”

Por Orani João Tempesta*

Estamos vivendo um período sem precedentes. Desde a Segunda Guerra Mundial, a Humanidade não enfrentava um inimigo tão difícil, invisível, que se propaga muito facilmente e em velocidade espantosa. Esse é o coronavírus ou Covid-19.

Estamos com todas as precauções sanitárias e procurando viver em nossa “clausura” doméstica. Tudo isso fazemos em favor dos nossos irmãos, familiares e de nós mesmos, pois temos que nos proteger.

A Humanidade nunca mais será a mesma depois dessa pandemia. São muitas transformações, chegará um novo tempo, um novo jeito de viver a vida.

Procissão de São Sebastião no Rio de Janeiro (Imagem de arquivo)

São tempos muito difíceis para a Humanidade. Nosso Santo Padre, o Papa Francisco, tem constantemente rezado pelo mundo, pelo fim desta pandemia. Da mesma forma, nossos sacerdotes e ministros da Igreja pedem insistentemente a Deus a mesma graça. Desde a grande gripe espanhola, nunca se pediu tanto para ficarmos em casa.

Enquanto a cura não vem, vamos vivendo nossa fé de modo diferente. São vários momentos compartilhados, no qual estamos aprendendo a viver o verdadeiro sentido de Igreja Doméstica em nossos lares. Acompanhamos as celebrações via internet, rezamos o rosário, meditações, novenas, sem contar os momentos de oração e louvor promovidos por nossos irmãos de arquidiocese. As igrejas estão abertas, e com as precauções sanitárias podemos participar dos sacramentos e dos demais atos litúrgicos presencialmente.

Diante deste cenário de pandemia, hoje recorremos à intercessão de São Sebastião. Santo conhecido como grande intercessor contra a peste, fome e guerra.

Segundo uma tradição, sua fama se deu a partir de 680 d.C. Naquele tempo, em Roma, uma peste vitimava muitas pessoas, assim como a pandemia do novo coronavírus que estamos vivendo. Quando relíquias de São Sebastião eram transportadas solenemente para a Basílica de São Paulo, a terrível epidemia desapareceu na hora daquela transladação. Em outras ocasiões, o mesmo milagre: em 1575, em Milão e, em 1599, em Lisboa, ambas ficando livres da peste pela intercessão do glorioso mártir São Sebastião.

Nascido em Narbona, na França, por volta de 256 d.C., São Sebastião sempre demonstrou apreço pelo serviço e doação ao cristianismo. Após receber o batismo cristão, zelou por sua fé por toda a sua vida.

Após entrar para o serviço no Império Romano como soldado, logo ganhou fama devido a sua saúde física, pela sua inteligência e dignidade. Em pouco tempo, tornou-se capitão do Império. Mesmo trabalhando para o Império Romano, São Sebastião não se esqueceu da sua missão recebida no batismo e iniciou sua corajosa obra de piedade entre os prisioneiros cristãos. No Império de Diocleciano, a Igreja e os cristãos eram cruelmente perseguidos, castigados e mortos. Diocleciano adorava outros deuses e negava a fé em Jesus Cristo.

São Sebastião desempenhava um papel fundamental entre os presos cristãos, levava palavras de conforto e ajuda aos encarcerados, o que trazia grande consolação a todos. Tudo isso feito de forma secreta, pois não podia ser descoberto pelo imperador.

Assim, ele se tornou defensor da Igreja Católica como soldado e capitão do Império Romano. Em seu coração, São Sebastião tinha o desejo de se tornar mártir. Em uma ocasião, ele foi denunciado para o imperador, o que deixou Diocleciano muito decepcionado e, ao mesmo tempo, enfurecido com ele por causa da traição.

São Sebastião não negou sua fé, pois era apaixonado por Jesus Cristo. O imperador, então, o condenou à pena de morte e, amarrado a um tronco, recebeu muitas flechadas, até os soldados pensarem que estaria morto. Uma mulher chamada Irene o conhecia, aproximou-se dele e percebeu que ele estava ainda vivo. Ela o levou para casa e cuidou dele até se recuperar.

Quando se recuperou, Sebastião procurou novamente o imperador, para tentar convencê-lo de que estava indo por um caminho tortuoso, pediu que ele parasse de perseguir os cristãos, pois assim, era como se ele perseguisse o próprio Cristo. Desta vez, ainda mais impressionado e irado, o imperador novamente o condenou à morte. São Sebastião foi brutalmente açoitado e martirizado no ano de 288 d.C.

No meio da cidade pestilenta e decadente, São Sebastião representa uma fonte de vida. Há a cidade dormente e sonolenta. E há, em contraponto, a cidade alumiada e atenta, que não se pode esconder sobre um monte. Não se pode apagar o horizonte. Não se acende uma luz para a colocar debaixo da ponte. De qualquer lugar se via, em qualquer lugar se via, que Sebastião trazia Cristo a arder no coração. Não o escondia.

Por isso, o imperador romano, Diocleciano, quis fazer desaparecer este soldado de Cristo. Por isso, o fez morrer na grande perseguição que desencadeou contra os cristãos nos primeiros anos do século IV.

O tirano Diocleciano fez o que podia fazer. Mas era pouco e tarde demais. Mandou quebrar o frasco cheio de perfume. Mas não se apercebeu que, ao quebrar-se o frasco, se soltaria o perfume, que nem o estrume de Roma podia apagar. E foi assim que o perfume intenso daquele amor imenso se espalhou por Roma e pelo mundo inteiro. Já sabemos que chegou também na nossa amada cidade esse cheiro intenso e perfumado, que sanava a fome, a peste e a guerra, mas também o frio e, sobretudo, o vazio do coração e da alma, a descrença e a indiferença, a maior doença que corrói a sociedade.

É Jesus que São Sebastião, nosso padroeiro, nos entrega hoje outra vez. Não para o guardarmos em alguma gaveta ou cofre-forte. Mas para o entregarmos generosamente aos nossos irmãos. Quando se celebra um mártir, não sobra lugar para o acidental, o marginal, o acessório. Um mártir não tem adereços. É Jesus que São Sebastião tem nos olhos e no coração. É Jesus a sua razão de viver. É Jesus a sua herança. É Jesus a sua esperança. Como quem diz: é Jesus a nossa herança. É Jesus a nossa esperança.

Rezemos juntos, pedindo a poderosa intercessão para nossa arquidiocese dizendo: São Sebastião glorioso mártir de Jesus Cristo e poderoso advogado contra a peste, defendei a mim, minha família e todo o país do terrível flagelo da peste e de todos os males para que servindo a Jesus Cristo alcancemos a graça de participar de vossa Glória no céu.

*Orani João, Cardeal Tempesta, O. Cist.

Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ

Publicado no jornal “Testemunho de Fé”, da Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro

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