Impactos do El Niño já são percebidos em diferentes partes do Brasil

Em novembro, a capital fluminense registrou por inúmeros dias temperaturas acima dos 40ºC. No dia 14 daquele mês, a sensação térmica superou os 58ºC, despertando também os alertas da autoridades de saúde para as questões de hidratação e proteção da população contra o forte sol.

Estiagem afeta a navegabilidade nos afluentes do rio Amazonas e prejudica as atividades locais Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

Por Daniel Gomes / O São Paulo*

As alterações na distribuição da umidade, no volume das chuvas e na temperatura provocadas pelo El Niño já estão sendo percebidas em muitas cidades brasileiras, com registros de secas prolongadas nas regiões Norte e Nordeste, chuvas acima do comum na região Sul e ondas de calor no Sudeste.

Em 22 de dezembro, o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) e o Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastre (Cenad) divulgou o boletim nº4 de monitoramento, previsões e os possíveis impactos do El Niño no Brasil, indicando que de janeiro a março de 2024, “as condições climáticas e meteorológicas no País serão influenciadas por este fenômeno”.

SECA NO NORTE E NO NORDESTE

Desde o segundo semestre de 2023, as regiões Norte e Nordeste sofrem com os impactos da estiagem. No estado do Amazonas, por exemplo, em setembro, houve a suspensão do transporte de cargas por navios para a Zona Franca de Manaus devido ao baixo nível das águas dos rios.

“O Monitor de Secas indicou o avanço e o agravamento da condição de seca no Norte e no Nordeste, com destaque para o aumento da área de seca extrema no estado do Amazonas e surgimento de áreas de seca grave na Bahia, Alagoas e Sergipe. Pela primeira vez, o mapa mostra a situação em Roraima, com todo o seu território em situação de seca e uma área significativa com seca grave”, consta no boletim do Inmet.

As chuvas que caíram no fim de novembro e no início de dezembro atenuaram a situação, elevando um pouco o nível dos afluentes do rio Amazonas, possibilitando a retomada da navegabilidade nos rios Purus, Juruá, Madeira, Solimões e Negro. “As vazões naturais no rio Madeira, em Porto Velho, em dezembro, ainda que abaixo da média, apresentaram significativo aumento e estão em patamares consideravelmente acima dos observados em novembro. Em 30 de novembro, perdeu a vigência a declaração da ANA de situação crítica de escassez hídrica do rio Madeira, e em dezembro a usina hidrelétrica de Santo Antônio voltou a operar dentro dos limites da outorga. As restrições de navegação no rio Madeira também foram revogadas pela Marinha do Brasil em dezembro, tendo em vista a elevação de níveis d’água”, consta no boletim do Inmet, no qual se informa, porém, que persistem vazões baixas e impactos potenciais nos rios Tapajós, Xingu e Tocantins.

NO SUL, FORTES CHUVAS E PERDAS AGRÍCOLAS

O atual El Niño tem causado o aumento do volume de chuvas nos estados da região Sul. “Durante o mês de novembro, as anomalias de precipitação foram superiores a 300 milímetros (mm) entre os setores norte do Rio Grande do Sul e praticamente todo o estado de Santa Catarina”, informa o boletim do Inmet.

“Na Região Sul, os níveis d’água caíram abaixo das cotas de alerta e inundação ao longo do mês de dezembro, registrando-se inundação em apenas uma estação no rio Uruguai e remanescendo a situação de alerta na estação de Alegrete no rio Ibirapuitã. Em Santa Catarina, os rios Chapecó e Itajaí-Açu registraram situações de alerta e atenção, respectivamente”, consta no documento.

Em 24 de novembro, a Secretaria da Agricultura e do Abastecimento do Estado do Paraná publicou o Boletim de Conjuntura Agropecuária, detalhando os impactos do El Niño para este setor. “Nos últimos meses, o estado do Paraná vem sentindo os efeitos do fenômeno El Niño, que tem provocado temperaturas e chuvas acima da média, especialmente na região Sul do estado. Atualmente, as perdas calculadas superam R$ 2,5 bilhões, considerando danos tanto à safra 22/23 quanto à 23/24”, lê-se no documento.

Estima-se a perda de 1,5 milhão de toneladas na produção agrícola no estado. A de trigo, por exemplo, recuou cerca de 980 mil toneladas em relação ao que se projetava colher. Além disso, o excesso de chuvas prejudicou a qualidade do que foi produzido, de modo que 420 mil toneladas de trigo terão como destino a produção de ração animal. “Considerando os fatores quantidade e qualidade, as perdas dessa cultura se aproximam de R$ 1 bilhão. Em outras culturas de inverno, especialmente a cevada, também houve redução. Nessa, os prejuízos podem somar R$ 200 milhões. Outras culturas da safra de verão que estão em término de plantio já registraram prejuízo estimado em R$ 750 milhões”, consta no informe da secretaria estadual.

Além desses prejuízos, produtores precisaram replantar algumas áreas. “O arroz irrigado, que tem o Noroeste como terra mais adequada no estado, teve áreas alagadas por mais de um dia com estimativa de perda de 36,6 mil toneladas”, prossegue o boletim.

ONDA DE CALOR NO SUDESTE

Outro impacto já mensurado do El Niño no Brasil é a onda de calor na região Sudeste. Na capital paulista, por exemplo, o mês de setembro foi o mais quente da série histórica de 19 anos de medições do Centro de Gerenciamento de Emergências Climáticas (CGE). Em novembro, foram registrados recordes de temperatura do ano, próximas a 37ºC. Moradores de cidades da região metropolitana de Campinas, do Vale do Paraíba e do Litoral Norte paulista também têm convivido com altas temperaturas desde setembro.

A situação não é diferente no Rio de Janeiro. Em novembro, por exemplo, a capital fluminense registrou por inúmeros dias temperaturas acima dos 40ºC. No dia 14 daquele mês, a sensação térmica superou os 58ºC, despertando também os alertas da autoridades de saúde para as questões de hidratação e proteção da população contra o forte sol.

O QUE ESPERAR NOS PRÓXIMOS MESES?

As projeções iniciais são de que o atual El Niño perdure até maio deste ano. De acordo com o boletim do Inmet, de janeiro a março deve chover menos que o normal em algumas partes das regiões Norte e Nordeste, o que causará impacto também nas reservas hídricas.

“Há expectativas de recuperação dos níveis d’água no solo em áreas do oeste da Região Nordeste e sul da Região Norte, devido à previsão do retorno gradual das chuvas. Entretanto, no norte da Região Norte e centro-leste da Região Nordeste, além de áreas do Mato Grosso do Sul, norte de Minas Gerais e Espírito Santo, a previsão indica armazenamento hídrico em níveis mais baixos”, informa o boletim. “Na faixa central do País, região Sudeste e centro-sul da região Nordeste não se descartam episódios de chuva expressiva em algumas localidades”, prossegue o texto.

De acordo com a Defesa Civil do Estado de São Paulo, no mês de janeiro o El Niño continuará a influenciar para altas temperaturas na região Sudeste, e os paulistas também devem se preparar para chuvas acima da média histórica. Em fevereiro, a projeção é a de que o calor intenso permaneça, mas que haja redução no volume de chuvas. “Contudo, é importante destacar que, embora não chova acima da média, haverá dias com chuva, principalmente ocasionadas por zonas de instabilidade geradas pelas altas temperaturas”, informa a instituição em seu site.

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