Para haver perdão e reconciliação é preciso olhar para algo maior

Como a espiritualidade monástica pode nos ajudar a encontrar a serenidade necessária para enfrentar os grandes sociais e políticos de hoje

San Giovanni Rotondo przed kanonizacją o. Pio w maju 2002 r. / ROLF HAID / DPA / DPA PICTURE-ALLIANCE VIA AFP

Aleteia / Ana Lydia Sawaya

Duas retas diferentes e paralelas nunca se cruzarão, porém, duas retas diferentes, mas inclinadas uma para a outra, se encontrarão. Onde? Num ponto mais alto. Assim é a reconciliação. O encontro entre duas diferenças só pode ocorrer quando ambas olham para um ponto mais alto do que o momento ou a circunstância atual – que une as duas retas ontologicamente. Reconciliação e perdão verdadeiros não nascem da boa vontade e da generosidade (embora ambas possam ajudar). Necessitam de uma outra coisa, maior e mais magnânima do que a vontade humana, que dificilmente consegue ultrapassar a barreira do voluntarismo.

Nas desavenças entre pessoas, onde estaria o ponto de inflexão e unidade? Na dimensão existencial, mais do que na intelectual ou na moral. Estamos unidos porque somos seres humanos, somos criaturas, amados por Deus, e em nós habita e, se deixarmos, age o Espírito.

É nossa condição ontológica que nos reúne. É olhar para o alto, para a nossa origem que nos coloca juntos. O diálogo é possível porque pensamos, sentimos e falamos; mesmo que com linguagem, sensibilidade e história de vida diferentes. O pensar, o sentir e o falar nascem do ser e não do agir. Quem consegue compreender essa realidade, é capaz de ter um mínimo de paz no coração e a serenidade necessária para poder observar com mais atenção o pensar, o sentir e o falar do outro (antes de enfurecer-se…).

Mas o que permite essa paz no coração e essa serenidade? Para os antigos monges, a amerimnìa – não ter preocupações excessivas, não ser dominado por preocupações de controle sobre as coisas ou os outros. Se somos todos seres humanos e todos estamos de passagem nesta vida, essa certeza retira de nós a ânsia de querer controlar, de se iludir que o mundo depende de nós. Essa condição pobre e justa impele-nos a entregar a Deus cada preocupação. Em consequência, não somos mais dominados pela rivalidade com alguém, pelos defeitos dos outros, pela ânsia de salvar o mundo… Eu e ele não estamos de passagem?

Cada ser humano vê um ângulo diferente, que lhe é próprio, e nenhum ser humano tem a visão do todo. Ninguém pode se arvorar a dizer “a verdade está comigo” ou “só eu tenho a verdade”. A visão mais ampla e, portanto, mais realista, será sempre a que abraçar, o melhor possível, os diferentes ângulos existentes na realidade. Por isso, a política será sempre a arte do diálogo entre diferentes, do equilíbrio de forças contrastantes e não do domínio de uns sobre os outros.

O cristão é chamado a dar-se conta e a contar para os outros sobre a senhoria de Deus na história – a não ser que esse cristão pense que Deus está dormindo… Se pensar assim, iludido, irá acreditar que a realidade depende dele…

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