Obras de irmã Dulce enfrentam crise financeira por falta de reajuste em contrato com SUS

O compromisso de Irmã Dulce sempre foi com as pessoas mais humildes

Obras Sociais Irmã Dulce. Foto: Wikimedia (CC BY 2.0)

ACI Digital

SALVADOR – Neste domingo, 13 de março, a morte de santa Dulce dos Pobres faz 30 anos. Em meio à programação festiva preparada em Salvador (BA) para esta data, a instituição fundada pela primeira santa brasileira, as Obras Sociais Irmã Dulce, enfrenta uma crise financeira. Para o final deste ano, a instituição prevê um déficit acumulado de R$ 44 milhões, devido à insuficiência dos valores recebidos por serviços prestados ao Sistema Único de Saúde (SUS).

As Obras Sociais Irmã Dulce foram fundadas em 26 de maio de 1959, por santa Dulce dos Pobres. O projeto é fruto da trajetória da religiosa, que durante mais uma década peregrinou em busca de um local para abrigar pobres e doentes recolhidos das ruas de Salvador. As raízes da instituição datam de 1949, quando irmã Dulce, sem ter para onde ir com 70 doentes, pediu autorização a sua superiora para abrigar os enfermos em um galinheiro situado ao lado do Convento Santo Antônio, na capital baiana. O episódio fez surgir a tradição de que o maior hospital da Bahia nasceu a partir de um simples galinheiro.

“As Obras Sociais Irmã Dulce são uma instituição privada filantrópica, sem fins lucrativos. Atuamos na área da saúde, assistência social, ensino e pesquisa, educação de crianças e adolescentes. Temos uma gama de atuações, sendo que a preponderante é a saúde”, disse o assessor corporativo da OSID, Sérgio Lopes.

A OSID é conhecida como um dos maiores complexos de saúde do Brasil com atendimento 100% gratuito. A instituição é responsável pela realização de 3,5 milhões de procedimentos ambulatoriais, 23 mil cirurgias e 43 mil internamentos por ano na Bahia. Só na sede em Salvador, são 954 leitos hospitalares. Na capital baiana, são feitos 10,8 mil atendimentos por mês a pessoas com deficiência e 9 mil para tratamento do câncer. Entre o público acolhido pela OSID, estão pacientes oncológicos, idosos, pessoas com deficiência e com deformidades craniofaciais, crianças e adolescentes em situação de risco social, dependentes de substâncias psicoativas, pessoas em situação de rua e demais usuários do SUS.

Atualmente, porém, a OSID tem um déficit operacional de R$ 24 milhões, valor que ainda pode ser acrescido em R$ 20 milhões até o final do exercício de 2022, resultando em um déficit acumulado da ordem de R$ 44 milhões.

“Na saúde, nossa atuação 100% SUS se dá através de um contrato que, no nosso caso, é junto ao Estado da Bahia, com recursos do Ministério da Saúde”, disse Lopes. “A grande questão da crise advém justamente deste contrato, que não prevê cláusula de reajuste”.

Lopes contou que o contrato possui metas quantitativas e qualitativas que a instituição deve atingir para receber o valor acordado, além de uma parcela variável, “vinculada a procedimentos de alta complexidade, que é por produção”. Mas, a remuneração é feita com base na tabela SUS, “que há muito tempo não sofre reajuste”.

Para se ter uma ideia do aumento de gastos que a instituição enfrentou nos últimos anos, Lopes citou o caso das luvas de procedimento, que antes da pandemia em 2019 tinham custo anual de R$ 690 mil e, em 2021, o custo foi de R$ 3,4 milhões.

Além do repasse do SUS, a OSID conta também com doações. Segundo Lopes, as pequenas doações de pessoas físicas acabam “somando um valor que hoje corresponde a cerca de 10% de nossa fatura”. Na prática, essas doações deveriam ser usadas para “melhoria do parque de equipamentos, algumas ampliações”. Mas, por causa da crise financeira, os recursos estão tendo que ser usados para “suprir essa falta da relação com o SUS”.

Lopes admitiu que, enquanto instituição, a OSID poderia optar por ter um contrato com o SUS e também, eventualmente, um atendimento privado. “Mas, isso fere completamente a missão da obra e o propósito dela desde a sua fundação por irmã Dulce. O compromisso dela [santa Dulce] sempre foi com as pessoas mais humildes e é algo que é um conceito basilar nosso e não vamos mudar nunca: tudo o que ofertamos aqui tem caráter de gratuidade para a comunidade”.

O assessor corporativo afirmou que há um risco de diminuição dos serviços prestados pela OSID. “Estamos neste momento utilizando recursos de conta garantida [um tipo de linha de crédito] junto ao banco, que é um recurso caro para nós, porque tem juros envolvidos. Não vamos ter como suportar isso por muito mais tempo”, disse.

Por isso, a instituição tem adotado medidas para reduzir gastos, como renegociação de contratos, suspensão de investimentos, corte de gastos administrativos. Também está tentando “aumentar a receita, sensibilizando principalmente o poder público, buscando um aporte, e alertando a sociedade pedindo que apoie neste momento mais do antes”.

Apesar da crise, Sérgio Lopes declarou que os funcionários da OSID têm “uma crença muito grande de que a providência vai chegar”. “Estamos vivendo este momento com muita apreensão, mas ao mesmo tempo com muita fé. Santa Dulce sempre dizia que esta obra é de Deus e o que é de Deus não fecha”, afirmou.

Como um gesto simbólico, no dia 4 de março, profissionais, voluntários, pacientes, religiosos e amigos da OSID promoveram um abraço na sede da entidade, em Salvador, para alertar a população sobre a crise financeira que ameaça a continuidade dos atendimentos.

A celebração dos 30 anos da morte de santa Dulce no dia 13 de março também será marcada por este alerta e pedido de ajuda à sociedade. Durante o dia, haverá missas às 7h, 10h30, 12h e 16h. E, às 8h30, a missa festiva será celebrada pelo arcebispo de Salvador, cardeal Sérgio da Rocha.

Para colaborar com a OSID, é possível doar qualquer quantia através do PIX deuslhepague@irmadulce.org.br, ou efetuar uma doação a partir do site www.irmadulce.org.br/doeagora.

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