
O papa pediu a criação de um amplo “processo participativo sobre o humano”, fundado “não no poder, mas na cura; não no lucro, mas no dom; não na desconfiança, mas na confiança”
Por Victoria Cardiel / ACI Digital
O papa Leão XIV protestou hoje (12) contra o “comércio” da guerra, ao mesmo tempo em que condenou atitudes de rejeição e “indiferença” em relação a imigrantes e pobres, ao dar as boas-vindas a alguns dos participantes da terceira edição do III Encontro Mundial sobre a Fraternidade Humana, no Vaticano.
Também estiveram presentes um grupo de ganhadores do Prêmio Nobel da Paz, como a ativista iraquiana Nadia Murad, a americana Jody Williams, a liberiana Leymah Gbowee, o iemenita Tawakkol Karman, o jornalista russo Dmitry Muratov, a advogada ucraniana Oleksandra Matviichuk, a jornalista filipina Maria Ressa e o médico congolês Denis Mukwege.
Diante deles, o papa falou sobre a necessidade de fraternidade e reconciliação num mundo onde o comércio da guerra “ceifa a vida dos jovens obrigados às armas”.
O mundo dá mais valor ao lucro
Em seu discurso, ele falou sobre a situação de muitos “imigrantes desprezados, detidos e rejeitados” que buscam salvação e esperança e “encontram muros e indiferença”. Leão XIV também denunciou o fato de que os pobres são frequentemente “culpados por sua pobreza, esquecidos e descartados, num mundo que dá mais valor ao lucro “.
O papa também destacou a existência de uma “vida hiper conectada, mas que a solidão corrói os laços sociais e nos torna estranhos inclusive a nós mesmos”. Diante de todas essas injustiças, ele disse que “a resposta não pode ser o silêncio”.
“Vocês são a resposta, com a sua presença, o seu compromisso e a sua coragem”, enfatizou Leão XIV em seu discurso no Palácio Apostólico, no Vaticano. “A resposta é a escolha de outra direção de vida, de crescimento, de desenvolvimento”.
Do mesmo modo, o papa pediu a criação de um amplo “processo participativo sobre o humano”, fundado “não no poder, mas na cura; não no lucro, mas no dom; não na desconfiança, mas na confiança”.
“O cuidado, o dom e a confiança não são virtudes do tempo livre: são pilares de uma economia que não mata, mas intensifica e alarga a participação à vida”, disse ele.
Assim, Leão XIV exortou os fiéis a reconhecer que o outro é um “irmão”, o que na prática significa “libertar-nos da ficção de nos considerarmos indivíduos isolados ou da lógica de formar relacionamentos só por interesse próprio”.
Planeta marcado por conflitos e divisões
O papa disse que o planeta está marcado “por conflitos e divisões” e pediu aos participantes da terceira edição do III Encontro Mundial sobre a Fraternidade Humana que estejam “unidos por um forte e corajoso não à guerra e um sim à paz e à fraternidade”.
Leão XIV citou a encíclica de seu antecessor, o papa Francisco, Fratelli tutti, para dizer que a amizade social e a fraternidade universal exigem necessariamente “o reconhecimento do valor de cada pessoa humana, sempre e em todos os lugares”. Ele também destacou que o papa Francisco disse que “a guerra não é o caminho certo para sair dos conflitos”.
O papa relacionou suas reflexões com o relato bíblico do assassinato de Abel pelas mãos de seu irmão Caim e falou sobre como essa relação fraterna imediatamente se tornou “dramaticamente conflituosa”.
No entanto, Leão XIV disse que esse primeiro homicídio “não deve nos levar a concluir: Sempre foi assim”. “A violência de Caim não pode ser tolerada como normal”, disse ele.
Para o papa, a pergunta divina dirigida ao culpado narrada no Gênesis é intrínseca à “nossa vocação” e ao “cânone da justiça”.
“Deus não se vinga de Abel com Caim, mas lhe faz uma pergunta que acompanha todo o caminho da história”, disse Leão XIV.
Desse modo, ele enfatizou que as grandes tradições espirituais e o amadurecimento do pensamento crítico permitem ir “além dos elos de sangue e dos laços étnicos, além daquelas fraternidades que só reconhecem os semelhantes e rejeitam os diferentes”.
Para o papa, também é interessante que na Bíblia, como a exegese científica revelou, sejam os textos mais recentes e maduros os que narram uma “fraternidade que transcende os limites étnicos do Povo de Deus e se fundamenta na humanidade comum”.
“As histórias da criação e as genealogias testemunham que todos os povos, mesmo os inimigos, têm a mesma origem, e que a Terra, com suas riquezas, é para todos, não só para alguns”, disse Leão XIV.
Ele também enfatizou que a fraternidade é o nome mais autêntico da proximidade e que para os fiéis significa “reconhecer o Mistério”, ou seja, a própria imagem de Deus “no rosto do pobre, do refugiado, inclusive do adversário”.
O papa incentivou os participantes do encontro a identificar caminhos locais e internacionais para desenvolver “novas formas de caridade social, de alianças entre saberes e de solidariedade entre as gerações”.
Não só listar direitos, mas ter ações
Por outro lado, ele pediu “caminhos populares que incluam também os pobres, não como destinatários de ajuda, mas como sujeitos de discernimento e de palavra”.
Leão XIV os encorajou a continuar esse trabalho de “semeadura silenciosa”, do qual, disse o papa, pode surgir um “processo participativo sobre o humano e sobre a fraternidade, que não se limite a enumerar direitos, mas tenha também ações e motivações concretas que nos tornem diferentes em nossa vida cotidiana”.
15 mesas temáticas
Os organizadores da terceira edição do Encontro Mundial sobre a Fraternidade Humana estruturaram esse evento internacional, promovido pela basílica de São Pedro, no Vaticano, hoje (12) e amanhã (13), em torno de 15 painéis temáticos.
São espaços de diálogo que servirão como laboratórios para a troca de ideias sobre vários temas, como o mundo da informação; meio ambiente e sustentabilidade; economia e finanças; e inteligência artificial.
Nesse contexto, a praça de São Pedro também sediará amanhã um concerto gratuito e aberto ao público.
Sob o nome Graça para o Mundo, a praça de São Pedro se tornará um palco ao ar livre que reunirá artistas internacionais como Karol G, o tenor italiano Andrea Bocelli e outros cantores como Pharrell Williams, John Legend, Teddy Swims, Jelly Roll, BamBam e Angélique Kidjo.
Essa noite será transmitida ao vivo nos serviços de streaming Disney+ e Hulu e pelo canal de televisão americano ABC News Live, permitindo que milhões de espectadores acompanhem o evento em tempo real.
O concerto também terá as vozes de um coral internacional de 250 pessoas, entre elas o Coro da Diocese de Roma. Todo o conjunto será regido pelo produtor musical de renome mundial Adam Blackstone.
Show de luz e som com 3 mil drones
A empresa Nova Sky Stories vai apresentar uma coreografia de cerca de 3 mil drones, inspirada nos afrescos da Capela Sistina. Essa encenação inovadora transformará a noite num afresco vivo de som e luz, uma experiência sensorial sem precedentes no coração do cristianismo, anunciou a Santa Sé.