‘O Senhor nos convida a sermos firmes como São Sebastião, a vivermos intensamente a vida cristã no meio das vicissitudes e hostilidades do mundo’
Por Carlos Moioli*

“A Festa de São Sebastião é um dia solene para a cidade e a arquidiocese, e incide no cotidiano de nossa vida”, disse o arcebispo do Rio de Janeiro, Cardeal Orani João Tempesta, ao presidir a missa solene do padroeiro na Catedral Metropolitana, no Centro, no dia 20 de janeiro.
A missa foi realizada após a carreata com a imagem de São Sebastião em carro aberto, iniciada por volta das 18h, que veio da Paróquia Nossa Senhora da Conceição, em Santa Cruz, na zona oeste da cidade. Segundo o arcebispo, a carreata foi a “maneira alternativa da procissão”, que não pôde ser realizada em vista da incidência da pandemia. “São nas situações de crises e dificuldades que encontramos soluções e novos caminhos que depois perduram”, disse.
A missa foi concelebrada pelos bispos auxiliares e diversos sacerdotes, e marcada com a apresentação dos padres cantores da arquidiocese e a bênção com a relíquia do padroeiro. Entre as autoridades presentes, o governador do Estado do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, e sua esposa Analine.
Na acolhida, Dom Orani lembrou que as leituras da celebração do Dia de São Sebastião falam de uma “vitória diferente”, de quem venceu a morte e passou pelo martírio. “Tudo foi feito, até jogado no esgoto, para que sua vida não fosse lembrada, nem houvesse culto em sua memória”. Aconteceu ao contrário. “Até hoje celebramos sua vitória”. E completou: “O Senhor nos convida a sermos firmes como São Sebastião, a vivermos intensamente a vida cristã no meio das vicissitudes e hostilidades do mundo”.
Homilia
Após a proclamação do Evangelho, o arcebispo pontuou aspectos da vida de São Sebastião com o processo sinodal em curso, convocado pelo Papa Francisco, de uma Igreja que é chamada a ser “comunhão, participação e missão”, que será concluído com os Sínodo dos Bispos, no Vaticano, em 2023.

“São Sebastião viveu numa época em que a Igreja era perseguida e sofrida, e servia, como militar, num lugar onde decidiam sobre os cristãos que seriam dizimados. Mesmo assim, ele viveu em comunhão com a Igreja, indo ao encontro dos cristãos que seriam martirizados para consolar, semear a esperança, falar da vida que não termina com a morte, a vida eterna. O martírio é uma vida que é entregue, e só se faz isso por um bem maior, que é Jesus Cristo. Ele viveu enquanto cristão como missionário, anunciando e testemunhando Jesus Cristo, e sua missão continua até hoje”, disse.
Dom Orani observou que a imagem peregrina de São Sebastião, durante a Trezena, passou pela cidade como ‘arauto da comunhão’, chamando as pessoas para a vivência da comunhão. Ele lembrou que o tema está em consonância com o ‘Ano da Comunhão’ em que vive a arquidiocese, dentro das propostas do Plano de Pastoral de Conjunto que, por sua vez, foram inspiradas nas Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil.

“A dimensão da comunhão e da unidade têm marcado a minha vida, já que meu lema contempla o pedido de Jesus Cristo: ‘Pai, que todos sejam um’. Falar de comunhão – num tempo de divisões no qual não se pode conversar com o outro por questões de intolerâncias – supõe viver a mesma fé, o mesmo batismo, a mesma preocupação de caminharmos juntos”, disse.
“Que possamos caminhar juntos como Igreja, sermos sinais de unidade para que o mundo creia em Jesus Cristo e veja que é possível conviver uns com os outros na fraternidade e na transparência de viver intensamente a unidade entre nós. A comunhão, a unidade é um ir avante, uma possibilidade que se acrescenta, um ideal a atingir, a seguir”, acrescentou.
Dom Orani destacou que o martírio não se resume só ao passado, mas continua ainda hoje, quando cristãos são perseguidos e perdem a vida por causa da fé. Existem também, lembrou o arcebispo, outros tipos de martírios, quando a vida e a fama das pessoas são destruídas. Em tempos de comunicação digital, há quem publica vídeos, por exemplo, que falam da Igreja e sobre a Igreja de diversas formas, mas que no fundo semeiam a divisão.

“As divisões não nos deixam caminhar juntos e atrapalham a missão evangelizadora. A unidade não significa uniformidade, mas uma pluriformidade na diversidade de dons. Os dons são diferentes, mas todos existem para o bem comum. É bonito ver os dons que vão se completando, sendo colocados para o bem da comunidade, da Igreja”, disse.
O arcebispo ressaltou que o mundo de hoje vive tempos de cansaços, quer pelas limitações da pandemia e da economia, e que no coração das pessoas há ódios, rancores, frustações e divisões. Ainda, dificuldades e incompreensões que oprimem as pessoas numa cultura de morte que vai crescendo cada vez mais, como exemplo, a luta pela implantação da eutanásia na América Latina.
“Nesta sociedade cansada e dividida, a missão é árdua. Também temos nossas dores, sofremos e choramos, sim, mas como São Sebastião, devemos semear a esperança. O mundo precisa de uma Igreja que fale e seja sinal de esperança e confiança no presente e no futuro. Às pessoas cansadas e abatidas devemos dizer: coragem, levantai-vos. Nós temos sempre algo a dizer, pois Jesus Cristo é a nossa vida, a nossa razão de e sentido de viver”, disse.
Como consequência da comunhão e da participação, Dom Orani destacou a importância da missão, afirmando que São Sebastião ainda hoje continua missionário. Ele lembrou dos gestos das pessoas quando a imagem peregrina do padroeiro passou, em carro aberto, pela cidade durante a Trezena.

“Ao ver a imagem de São Sebastião, as pessoas param, fazem o sinal da cruz, estendem as mãos, rezam. Aos olhos dos intelectuais e racionalistas pode parecer uma bobagem, mas são sinais que falam ao coração do nosso povo carioca. São ações como a Trezena – que devem ser acrescidas do anúncio explícito e do testemunho de vida – que impulsiona as pessoas em voltar para a comunidade, a Igreja, de caminhar juntos como povo de Deus”, disse.
“A missão nos desafia. Não devemos evangelizar só com aqueles que participam e precisam crescer na fé ou aqueles que não voltaram depois da pandemia, mas também com aqueles que nunca vieram, mas que foram batizados e têm vocação para ser cristãos. Ser missionário é muito mais que evangelizar quem caminha conosco, é ir além das fronteiras”, acrescentou.
Ao concluir a homilia, o arcebispo disse: “Pedimos ao Senhor, por intercessão do nosso padroeiro São Sebastião, de viver e caminhar cada vez mais na direção da comunhão e da unidade, e de semear a esperança. O Cristo ressuscitado nos move e nos impulsiona à missão porque Ele é o sentido da nossa vida. Não existe Igreja que não seja missionária. Precisamos ser missionários, evangelizadores, consumir nossa vida pelo Reino, anunciar de forma explícita em quem e como cremos. Que o grito de São Sebastião nos inspire e também nos faça ‘arautos da comunhão’, e que 2022 seja um ano repleto de esperança e de confiança no Senhor”.
Oratório de São Sebastião
Diferente dos anos anteriores, por causa da pandemia, não foi possível a realização do Auto de São Sebastião. Porém, houve uma novidade que alegrou e encantou a todos os fiéis que estavam na Catedral para festejar o padroeiro São Sebastião. Os cantos da celebração, a pedido de Dom Orani, foram apresentados por um grupo de sacerdotes que cantam, que deram sequência no final.
“São os padres que tem o dom de cantar. Um grupo de sacerdotes que se juntou sob a regência do maestro Thiago Debossan para entoar os cantos da celebração. No final, alguns interpretaram peças clássicas do repertório sacro. Pela primeira vez em nossa arquidiocese, São Sebastião foi festejando com a arte do canto”, disse um dos cantores do grupo, padre Francisco Reinaldo Gonçalves Oliveira. Fizeram também parte do grupo os padres Sergio Cavalcanti Muniz, Renato Martins Gonçalves, José Carlos Rosa Silva Junior, José Augusto Pedroza da Silva, Cleyton da Silva de Oliveira e frei Almy.
*Carlos Moioli é Diretor de Jornalismo da Arquidiocese do Rio