O Iraque que espera Francisco

Nesta sexta-feira, 5 de março, o Papa Francisco dá início à 33ª Viagem Apostólica de seu Pontificado, visitando a República do Iraque (Jumhūriyyat al-‘Irāq)

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Vatican News

Nesta sexta-feira, 5 de março de 2021, o Papa Francisco deu início à 33ª Viagem Apostólica de seu Pontificado, visitando a República do Iraque (Jumhūriyyat al-‘Irāq).

O Iraque, país da Ásia Ocidental, faz fronteira com a Arábia Saudita e o Kuwait ao sul, com a Turquia ao norte, Jordânia e Síria a oeste e Irã a leste. É atravessado pelos rios Tigre e Eufrates e é banhado a sudeste, em um pequeno trecho, pelo Golfo Pérsico.

Com 438.317 km², o país tem 38.836.000 habitantes, 89 habitantes/km². Somente a capital, Bagdá, tem 6.811.955 de habitantes. Os idiomas oficiais são o árabe e o curdo. Os árabes representam 85% da população e os curdos 10%. Os muçulmanos são 98,5% da população, enquanto os católicos 1,5%.

O Iraque é uma República parlamentar federal, faz parte da Liga Árabe, OCI, ONU e OPEP, sendo também membro observador da OMC. A unidade monetária do país é o dinar iraquiano (1 EUR = 1.757 IQD)

Berço da antiga civilização mesopotâmica, anteriormente parte do Império Otomano e, após o colapso deste último, confiado em 1920 pela Liga das Nações à administração britânica (Tratado de Sèvres), o Iraque se tornou uma monarquia independente em 1932 e uma República em 14 de julho de 1958, após um golpe de Estado do general Karim Kassem.

Historicamente multiétnico e multirreligioso, apesar da clara prevalência de muçulmanos, o país lutou por muito tempo para alcançar um consenso nacional, devido às divisões e rivalidades de seus componentes étnicos (árabes claramente majoritários, curdos concentrados no norte, – sabeus, mandeus, yazidis, circassianos, turcomenos, Shabak, assírios) e religiosos (muçulmanos xiitas e sunitas, cristãos …).

As Guerras do Golfo

As últimas décadas foram marcadas pelo domínio do Partido Nacionalista Baath (“Renascimento” em árabe), que chegou ao poder em 1968 após um golpe de Estado apoiado pela minoria sunita e, em particular, por seu líder Saddam Hussein, que governou o país com punho  de ferro de 1979 a 2003, marginalizando o componente xiita, reprimindo com sangue as minorias e a oposição e desencadeando uma guerra sangrenta e custosa contra o Irã (1980-1988), que custou a vida de mais de um milhão de pessoas.

O custo humano e material do conflito não impediu os objetivos expansionistas de Saddam Hussein que, em 2 de agosto de 1990, invadiu o Kuwait, provocando, em 26 de fevereiro de 1991, a intervenção militar de uma ampla coalizão internacional que operou sob o mandato do ONU, mas de fato liderada pelos Estados Unidos (Primeira Guerra do Golfo). Uma guerra fortemente contestada pelo Papa João Paulo II (que também havia condenado a agressão ao Iraque) que a considerava como “uma aventura sem volta” (Audiência Geral de 16 de janeiro de 1991) e que terminou com a rápida derrota do Iraque.

Após a saída do Kuwait, o país sofreu uma grave degradação econômica devido ao embargo imposto pelas Nações Unidas. A crise do regime precipitou-se após os ataques de 11 de setembro de 2001 às Torres Gêmeas, que o governo dos Estados Unidos quis vincular a Saddam.

Em 20 de março de 2003, os Estados Unidos e o Reino Unido, apesar da opinião contrária dos demais membros do Conselho de Segurança da ONU (França, China e Rússia), a oposição da opinião pública e a vigorosa oposição da Santa Sé expressa em repetidos apelos de João Paulo II pelas “tremendas consequências” que um ataque causaria às populações iraquianas e ao equilíbrio de toda a região do Oriente Médio (Angelus de 16 de março de 2003) deram início à Segunda Guerra do Golfo.

A intervenção militar, justificada sob o pretexto das armas de destruição em massa de Saddam, terminou em pouco tempo com sucesso, mas produziu uma situação de vácuo político-institucional onde cresceu o flagelo do sectarismo e se multiplicaram ataques e milícias fora do controle da autoridade central. Saddam Hussein, capturado em 2003, foi julgado e executado em 2006.

Em 2004, o Iraque voltou a ser um Estado independente e soberano e em 15 de outubro de 2005 um referendo aprovou a nova Constituição que instituiu um Estado parlamentar federal no qual é concedida uma forte autonomia às províncias. Em 15 de dezembro de 2011, a missão dos EUA no Iraque foi oficialmente encerrada e o último grupo de soldados deixou o país em 18 de dezembro.

Ascensão do Estado Islâmico

O lento e difícil processo de normalização do país sofreu uma abrupta interrupção em 2014 com a ascensão do grupo fundamentalista Estado Islâmico no Iraque e no Levante (Isis, Daesh em árabe) que conquistou inúmeras cidades no Iraque ( Al-Fallūjah e Ar-Ramādī em janeiro, Kirkūk e Mosul em junho), valendo-se do apoio das tribos sunitas que lutavam contra o governo de maioria xiita. O Iraque, assim, ficou dividido em três: uma parte xiita sob o controle de Bagdá no sudeste, uma parte curda no nordeste e uma controlada pelo EI.

Lançada em março de 2015, a contra-ofensiva do exército, apoiada pela coalizão liderada pelos EUA, conseguiu recapturar os territórios mantidos pelo Daesh nas partes oeste e norte do país. Em 9 de dezembro de 2017, o primeiro-ministro al-‘Abadi declarou oficialmente que a guerra contra o Califado havia sido vencida. Com sua derrota, abriu-se uma nova fase no país em que a guerra terminou oficialmente (mesmo que a ameaça do terrorismo jihadista não tenha desaparecido, como evidenciado pelo massacre em Bagdá de 21 de janeiro de 2021, reivindicado pelo Daesh), mas paz e estabilidade ainda são precárias.

Clima de insegurança

Se as siglas islâmicas parecem agora representar instâncias minoritárias no cenário político iraquiano, conforme confirmado pelas últimas eleições parlamentares de 12 de maio de 2018 vencidas pela coalizão Sairoun (formada pelos sadristas do líder político Moqtada al-Sadr e pelo Partido Comunista) e se as reivindicações de independência do Curdistão iraquiano deram lugar ao diálogo e à colaboração com o governo de Bagdá, continuam fortes a insegurança e as divisões sectárias dos vários componentes étnico-religiosos do país.

Contribuem para o clima de insegurança, favorecido pela fragilidade do Estado central, o aumento das tensões sociais provocadas pelo agravamento da crise econômica, o desemprego que já atingiu os 22% e atinge em particular os jovens, e a corrupção endêmica a qual se soma o drama de 1,7 milhão de pessoas deslocadas internamente.

Protestos

Em 2018, o descontentamento popular resultou em violentos protestos de rua que começaram em Basra, a região petrolífera mais importante do Iraque e palco de uma crise de água em grande escala. As manifestações continuaram por meses, estendendo-se a todo o sul xiita, levando à renúncia do premiê Mahdi e recomeçaram recentemente. Além da corrupção da classe dirigente, o lerdeza dos serviços públicos e a morosidade da burocracia foram alvos dos manifestantes.

Contribuíram para fragilizar a estabilidade política do país a retomada das iniciativas das milícias do EI e diversos ataques contra civis, como o já citado atentado de 21 de janeiro a um mercado de Bagdá, além da ingerência de potências estrangeiras como a Turquia, protagonista nestes últimos meses de várias incursões em território iraquiano contra os curdos e o Irã.

Com o exasperamento das relações entre Teerã e os Estados Unidos, principalmente após o assassinato, em 3 de janeiro de 2020 do general iraniano Qasem Soleimani no aeroporto internacional de Bagdá, o ativismo das milícias pró-iranianas no país cresceu. Uma dessas milícias assumiu a responsabilidade pelo ataque com foguete à base militar da coalizão internacional liderada pelos EUA em Erbil, em 15 de fevereiro passado.

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