O brasileiro frei Rafael Normando, atual coordenador da Basílica de São Francisco em Assis, na Itália, é um dos participantes do II Encontro Internacional para Reitores de Santuários no Vaticano. Em entrevista ao Vatican News, o frade franciscano enfatizou a importância do acolhimento empático aos peregrinos e a responsabilidade de proporcionar a cada pessoa uma experiência que pode marcar toda a sua trajetória de vida.
Bianca Fraccalvieri e Thulio Fonseca – Vatican News
Frei Rafael Normando, brasileiro e atual coordenador da Basílica de São Francisco de Assis, santuário mundialmente conhecido, é um dos participantes do II Encontro Internacional para Reitores e Colaboradores de Santuários, realizado de 9 a 11 de novembro na Sala Paulo VI, no Vaticano. O frei, originário de Brasília-DF, compartilhou suas experiências e perspectivas em uma entrevista ao Vatican News.
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Ao falar sobre o encontro de reitores, Frei Rafael destacou a importância de compreender as dinâmicas e desafios enfrentados pelos santuários, especialmente no que diz respeito à oração e ao acolhimento dos peregrinos. Segundo o coordenador, a Basílica de Assis, que abriga os restos mortais de São Francisco, recebe até dez mil visitantes por dia. Junto com essa complexa logística, a necessidade de abordar cada peregrino com empatia, independentemente de suas origens ou motivações, é o foco principal da basílica franciscana.
O papel crucial da empatia
Para Frei Rafael, a empatia desempenha um papel crucial no acolhimento, e a habilidade de identificar as peculiares diferenças que cada grupo de peregrinos traz é uma prática importante, pois cada pessoa traz consigo expectativas e até mesmo feridas. Ele destaca a responsabilidade significativa que os reitores e colaboradores dos santuários têm ao acolher os peregrinos, e ressalta a importância de compreender os sonhos, anseios e até mesmo as crises de cada pessoa.
“Devemos cuidar de todos esses peregrinos de modo muito especial no que se refere à fé, no que se refere a acolher o peregrino com os seus sonhos, as suas vontades, as suas crises. Para muitas pessoas, o santuário é “a última ilha”, é a última oportunidade que ela está dando para si mesma para encontrar a paz no seu coração. E por isso a responsabilidade é muito grande, seja nós, frades da Basílica de São Francisco de Assis, ou de qualquer outro santuário. Não acolhendo bem o peregrino, nós podemos destruir sonhos, nós podemos contribuir para um problema muito mais sério na vida da pessoa, claro, cada um é responsável pela sua própria vida, mas a nossa contribuição para ajudar esses peregrinos que querem encontrar paz precisa ser vivenciada.”
A importância da acolhida e do acompanhamento espiritual
O frade brasileiro compartilha suas experiências de encontros com peregrinos que muitas vezes ocorrem fora do santuário, pois algumas pessoas não reconhecem o local ou se sentem indignas de estar ali. O franciscano sublinha a importância de ir ao encontro dos peregrinos, de ajudá-los a superar as resistências e, deste modo, proporcionar momentos de diálogo e reflexão, oferecendo-lhes apoio espiritual.
“Algumas pessoas vêm feridas da história que elas têm, e a confissão, a direção espiritual é a única oportunidade que podem ter por estar ali. Às vezes eu caminho na praça, em frente da Basílica, e encontro os visitantes. Pessoas que às vezes não têm coragem de entrar na Basílica ou de ir diretamente para as confissões. E encontrar um frei que caminha ali na praça é uma oportunidade. Algumas pessoas sentem um pouco de resistência, então que sejamos nós a ir ao encontro delas. Já aconteceu comigo de atender uma direção espiritual na praça, sentado num banco, e isso se faz conversando com as pessoas, é muito gratificante. A gente pensa que somente nós, frades, ensinamos os outros, mas nós aprendemos muito com os peregrinos. Cada pessoa é um dom de Deus para nós, frades da Basílica de São Francisco.”
É preciso falar de paz
Ao recordar a mensagem pertinente e atual sobre a paz, associada diretamente a São Francisco de Assis, o coordenador abordou o desafio contemporâneo de falar sobre este tema no mundo atual, ele destaca não apenas as guerras físicas, mas também as guerras internas que todas as pessoas podem enfrentar. Frei Rafael enfatiza que a paz começa internamente e só então pode ser expressa de maneiras simples, através do olhar, do encontro e das palavras.
“É um desafio muito grande falar de paz no mundo de hoje. Não somente quando falamos de guerras concretas, no sentido de guerras físicas em países, mas também as guerras internas que podemos ter. Cada peregrino pode ter sua guerra pessoal ou guerra com outras pessoas. E ali também é preciso falar de paz. Eu acredito que a primeira realidade que nós, frades, ou qualquer pessoa que está em Assis queira passar isso, é estar em paz consigo mesmo. Quando nós não estamos em paz conosco mesmo, não conseguimos fazer essa passagem. E ao falar de paz, eu sou o primeiro que deve vivê-la. Isso acontece por meio do olhar, do encontro, de uma palavra. Às vezes, com muita paciência, ouvindo uma pessoa e respondendo de forma muito caridosa, conseguimos ajudar de alguma forma.”
“São Francisco aconselhava os frades a pregarem com palavras simples, pois assim seriam compreendidos tanto por intelectuais quanto por pessoas simples, e enfatizava que todos se beneficiariam dessa abordagem. O Papa Francisco segue essa prática, promovendo a linguagem da misericórdia. E nós precisamos disso, precisamos manifestar esse amor de Deus no nosso cotidiano, pois ninguém pode negar o amor.”